Sistema de segurança mais sofisticado dificulta a vida do tráfico e melhora imagem do Brasil no exterior, explica PF. Em Viracopos, o silêncio dos flagrantes não é sinal de calmaria — é sinal de alerta para o crime. Menos prisões, menos tentativas, mais estratégia. O que começou como reação virou modelo de eficiência.
O número de flagrantes no Aeroporto de Viracopos caiu 15% entre 2023 e 2024. O intervalo entre as ocorrências também vem aumentando: de um flagrante a cada sete dias em 2023, para oito em 2024, e 18 dias em 2025 até agora. As prisões também diminuíram: 55 em 2023, 49 em 2024, e nove até o momento em 2025.
Para a Polícia Federal, essa redução não é sinal de relaxamento, mas de eficácia, ressalta o delegado-chefe da Polícia Federal em Campinas, Edson Geraldo de Souza:
“Os números vêm diminuindo bastante em relação ao número de prisões, de flagrantes e de droga apreendida. Isso não quer dizer que esteja se trabalhando menos, ao contrário, trabalha-se com o mesmo afinco, com a mesma dedicação, com a equipe cada vez mais treinada, com muito mais tecnologia, mas mesmo assim os números vêm caindo. E isso provavelmente decorre não só do trabalho que tem sido feito, mas também da publicidade e transparência que tem sido dado a esse trabalho. E o que nós podemos dizer é que, além do treinamento dos policiais, além do know-how adquirido, há muita tecnologia envolvida nessa fiscalização, objetivando não só a repressão ao crime, mas também a segurança da aviação civil”, afirma o delegado.
Ele explica que isso permite concentrar o efetivo nos pontos vulneráveis do sistema:
“O crime trabalha com fragilidades, ou seja, ele entende um sistema de segurança, entende quais são as fragilidades desse sistema e acabam por explorá-la. Por parte da Polícia Federal, nós já identificamos quais eram as fragilidades e a tecnologia veio acrescentar um grande poder de trabalho às equipes de policiais. Então nós podemos deixar hoje a tecnologia e os pontos fortes da fiscalização agirem por si mesmo e o serviço de inteligência então se ocupará das eventuais fragilidades. Tanto o grupo de repressão ao tráfico de drogas quanto a inteligência colocada dentro do aeroporto funciona 24 horas e também funciona em comunicação permanente com todas as outras unidades de inteligência de todo o país da Polícia Federal”, ressalta.
A repressão também se dá por meio de operações investigativas, que ajudam a desarticular as organizações criminosas por trás do tráfico:
“A fiscalização de Viracorpos se dá pelo que nós podemos chamar de 3Is, investigação, inspeção e inteligência. A inspeção é aquela parte visível do aeroporto, quando o passageiro chega no aeroporto e ele vê todo o check-in, a identificação, a conciliação entre passageiro e mala, a identificação das suas bagagens, as esteiras, o espectrômetro de massa, o body scanner e assim por diante. Essa é a parte visível. Existe a parte invisível, que é a investigação e a inteligência. Há muitas organizações criminosas sendo investigadas, inclusive em Viracorpos, como foi o exemplo da operação Gryphus dessa semana. Além das investigações em que nós já temos pessoas no radar, existe o serviço de inteligência e o serviço de inteligência é aquele que detecta ruídos no processo, aquele que detecta algo fora do comum. E é a esse serviço de inteligência que é dado o dever de identificar. As pessoas que estão fora do radar da inspeção ou fora do radar da investigação, mas que podem com certeza estar transportando drogas.”
Hoje, Viracopos opera voos internacionais para Fort Lauderdale e Orlando, Lisboa, Assunção e Paris. As rotas mais visadas para tráfico são Lisboa e Paris, por onde sai cocaína. Já chegam ao Brasil drogas sintéticas da Europa:
“Aliado à inteligência, à inspeção e às investigações, a Polícia Federal conta com equipamentos de última geração para poder identificar facilmente a carga de drogas dentro das malas. Então, há o raio-x portátil, há o Raman para identificar quais são as substâncias que são carregadas, especialmente drogas sintéticas, diferenciando o que a pessoa pode alegar que seja remédio daquilo que seja considerado droga ilícita.”
Mesmo com os custos e dificuldades, a PF explica que mantém a repressão rigorosa ao tráfico internacional de drogas, não apenas por compromissos diplomáticos:
“Quando falamos de um aeroporto internacional, nós falamos de relações diplomáticas e de relações de qualidade e de procedimentos internacionais. A ICAO, que é um órgão de fiscalização internacional da aviação civil ligado ao ONU, também faz fiscalização de aeroportos e faz também a checagem da qualidade das características da segurança de cada aeroporto. Então, quando nós falamos de fiscalização, nós estamos preocupados em receber a nota máxima em comparativo ou em padrões internacionais. Então, é por isso que esse trabalho tem que ser feito com tecnologia, com segurança e com o pessoal altamente treinado, porque ele também refletirá na segurança da aviação civil internacional. Então, quando nós falamos de outros países, os países estão, sim, olhando para como um determinado país cuida da sua porta de entrada ou da sua porta de saída em relação ao país que chega. Então, quando nós temos uma linha aérea. Que sai do Brasil e chega aos Estados Unidos, Portugal e França, esses países estão muito interessados em como é feita a fiscalização, não só de atos ilícitos, mas também dos crimes relacionados, por exemplo, ao tráfico internacional de drogas”, diz.
Para o Brasil, coibir esse tipo de crime também evita o fortalecimento de facções locais, que se financiam com os lucros do tráfico para comprar armas e aliciar novos membros:
“Tão importante quanto essa fiscalização para evitar a prática de crimes e para evitar que essas pontes aéreas se transformem em corredores do tráfico, nós temos que pensar que é muito importante internamente que isso seja repelido, que isso seja reprimido. E por que isso? Mais importante do que evitar que a droga entre em outro continente, o que é uma preocupação primordial, é impedir que as organizações criminosas no Brasil recebam, lucrem com esse comércio. Porque quando o dinheiro vai para essas facções, para essas organizações, e aí nós estamos diante do fortalecimento financeiro dessas organizações. E o fortalecimento financeiro é justamente o contrário de toda a técnica hoje utilizada para a repressão das organizações criminosas, que é a descapitalização. Então, cada remessa com lucro, cada remessa que essas organizações criminosas no Brasil possam receber do sucesso do transporte da droga, tem que ser evitado para uma questão de política interna de pacificação social.”
Enquanto o trabalho da Polícia Federal é fortalecido – dentro e fora do aeroporto – por meio de um sistema complexo que integra tecnologia, inteligência e investigação, o delegado ressalta o reconhecimento da corporação também em cenário internacional:
“Em 2010, a Polícia Federal, na sua visão de futuro, tinha a ideia de se tornar uma referência mundial em polícia judiciária. Quando nós chegamos agora a 2025, o secretário-geral da Interpol é um delegado de Polícia Federal, o delegado Valdecy Urquiza, demonstrando o respeito, demonstrando o reconhecimento internacional dos trabalhos que a Polícia Federal tem feito no Brasil. Isso é um motivo de orgulho para nós. Hoje, nós trabalhamos normalmente com as agências internacionais, quer como Interpol, quer como Polícia Federal, em parceria, em cooperação com o FBI, a Polícia Judiciária de Portugal, a Polícia Espanhola e assim por diante. Não há hoje limitação, diante do respeito, de conquista, de credibilidade que a Polícia Federal tem, em trabalhar com qualquer agência internacional ou estrangeira de polícia. E isso é motivo de grande orgulho. E é um resultado que a sociedade sente quando nós falamos de Viracopos, quando nós falamos de roubo de carga, quando falamos de crimes financeiros e assim por diante.”
A transformação de Viracopos mostra que a combinação de tecnologia, inteligência e estratégia pode criar um sistema eficaz, que não apenas prende, mas principalmente previne e desestimula o crime. Para o Brasil, significa mais segurança, respeito internacional e a esperança de um futuro com menos tráfico e violência.
Por: Giovanna Peterlevitz/acidade on