Os documentos, computadores e pen drives apreendidos na quarta-feira (12) na Operação Coffee Break, da Polícia Federal, devem ser o próximo passo das investigações contra o esquema de superfaturamento de licitações para a compra de materiais didáticos na região.
Muitos dos itens foram recolhidos durante as diligências realizadas no Departamento Administrativo e na Secretaria de Governo de Hortolândia.
No centro das apurações estão as movimentações financeiras atípicas detectadas em torno da empresa Life Educacional, que comercializa livros didáticos e kits de robótica para as redes municipais de ensino, mas a preços muito acima dos valores do mercado.
Segundo as investigações, produtos adquiridos com valores entre R$ 1 e R$ 5, por exemplo, eram vendidos para as prefeituras por valores que poderiam variar dos R$ 60 aos R$ 80.
A secretária de Assuntos Jurídicos de Hortolândia, Silvânia Anizyo, afirmou que a Prefeitura mantém o contrato com a Life, mas aguarda o acesso aos autos antes de tomar outras eventuais medidas administrativas.
“Nós estamos solicitando uma cópia do procedimento, da investigação, para saber realmente do que se trata”, afirmou Silvânia.
Em Sumaré, o secretário municipal de Justiça, Valdemir Moreira dos Reis Júnior, também confirmou a continuidade do contrato, firmado na gestão anterior. No entanto, ele ressalta que ele não foi utilizado para a aquisição de materiais didáticos nesta Administração.
“Ele é vigente, porém ele não está sendo executado. Sobre ele, inclusive, existe uma sindicância aberta pela secretaria de Educação desta gestão que está apurando a lisura desse contrato”, declarou.
De acordo com os investigadores, a entrada da Life em prefeituras como a de Hortolândia e de Sumaré, seria resultado de um amplo esquema de lobby para favorecer a vitória dela nas licitações.
Em alguns casos, eles apontam sinais de direcionamento, já que a empresa foi a única a disputar os pregões.
Em um deles, realizado em 2025 para o “fornecimento de livros para manutenção do projeto de ciência e tecnologia educacional da rede municipal”, a Life arrematou a disputa com valor global superior aos R$ 20,4 milhões. A investigação afirma que a lista de livros apresentada no pregão só poderia ser fornecida pela Life.
Os investigadores também afirmam que o suposto favorecimento contaria com as atuações do vice-prefeito de Hortolândia, Carlos Augusto César, o “Cafu”, e do secretário municipal de Educação, Fernando Gomes de Moraes.
No caso de Hortolândia, os recursos financeiros que permitiam realizar os pregões e a aquisição dos materiais didáticos não resultavam apenas do orçamento do próprio município.
Uma parcela desse montante era viabilizada por meio do FNDE (Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação), sediado em Brasília e ligado ao Ministério da Educação. O órgão é o responsável por implementar políticas educacionais do MEC em todo o país.
Segundo o material das investigações, evidências demonstram que Carla Ariane Trindade, que é ex-nora do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, viajava com frequência a Brasília para tentar influenciar decisões do Governo Federal.
A proximidade do antigo parentesco seria um dos argumentos usados no convencimento dos interlocutores.
A investigação também aponta sua possível influência em cidades como Mauá, Diadema e Campinas.
As apurações mostram que, em ao menos duas oportunidades, as viagens teriam sido pagas com recursos de André Gonçalves Mariano, sócio administrador da Life Educacional.
Os documentos aos quais o Grupo EP teve acesso também mostram que Kalil Bittar, ex-sócio do filho do presidente Lula, Fábio Luís Lula da Silva, também tem participação crucial no esquema.
Bittar é apontado pela investigação como um intermediador político e “lobista” em favor da Life Educacional.
Os documentos citam evidências de que Bittar trafegava com facilidade pelo Governo Federal, como ao participar de uma comitiva brasileira que viajou à China.
Os documentos da investigação ressaltam que não foi identificado vínculo formal dele com qualquer órgão público, mas este seria um exemplo de como Kalil defendia os interesses de André Mariano no poder público.
Nós procuramos o Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação para comentar o caso, mas não obtivemos retorno até o fechamento desta reportagem.
A defesa do vice-prefeito de Hortolândia, Cafu César, afirma que está estudando os autos do processo, para pedir a reversão da prisão preventiva de Cafu.
A Prefeitura de Hortolândia declarou que está à disposição dos órgãos de segurança para colaborar com as investigações.
A Administração ressalta que os pregões seguem a Lei de Licitações e Contratos Administrativos, com trâmites de transparência.
A defesa do secretário de Educação, Fernando Gomes de Moraes, disse ter sido pega de surpresa com a prisão preventiva, sobretudo pela trajetória pública pautada pela legalidade e pela integridade na pasta.
Os advogados reiteram a confiança de que os fatos serão devidamente esclarecidos e sua inocência reconhecida.
Em Sumaré, a atual gestão da Prefeitura informou que tem colaborado integralmente com as autoridades, fornecendo todos os documentos e informações solicitadas.
A Administração municipal reforçou que os fatos investigados referem-se exclusivamente à gestão anterior, e não envolvem contratos ou ações do governo atual.
Por meio de nota, a Life Tecnologia Educacional afirmou que não vai se pronunciar sobre as investigações.
O jornalismo do Grupo EP também procurou Kalil Bittar e Carla Ariane Trindade, mas também não obteve retorno até o fechamento desta reportagem. O espaço segue aberto para manifestação.




