Campinas aparece entre as cidades mais estressadas do Brasil. A metrópole está entre as líderes do ranking nacional, perdendo apenas para grandes capitais. O levantamento é da Bliss Data 2025, e aponta Campinas como a 6ª cidade mais estressada do país, atrás de São Paulo, Brasília, Belo Horizonte, Florianópolis e Curitiba.
A pesquisa ouviu mais de 30 mil brasileiros, em quase dois mil municípios, e traçou o perfil de quem mais sofre com o estresse no dia a dia urbano. Segundo o estudo, o grupo mais afetado é o de adultos em idade produtiva. Pelo menos 90% dos entrevistados trabalham, a maioria é casada e relata sintomas como insônia, ansiedade e sobrecarga emocional.
Entre os principais fatores apontados estão o trânsito e o transporte público, citados como grandes fontes de estresse cotidiano. A psicanalista e professora do Departamento de Saúde Coletiva da Unicamp, Rosana Onocko Campos, fala dos impactos da rotina urbana na saúde mental. “O estresse é uma reação do nosso corpo, do nosso psiquismo, a uma sensação de ameaça. O problema é quando esse estresse é continuado, porque ele traz uma série de consequências para a saúde e pode desencadear hipertensão arterial, além de alguns transtornos autoimunes”.
A professora chama atenção para um ponto central da pesquisa: o peso do deslocamento diário na vida das pessoas. Segundo ela, o trânsito e o transporte público não são apenas dificuldades inevitáveis das grandes cidades, mas questões que podem ser enfrentadas com políticas públicas. “O transporte público não é uma fatalidade natural. A gente tem política pública para melhorar isso. A dificuldade de andar em Campinas faz com que quem pode vá de carro próprio, isso entope o trânsito, aumenta o barulho e a poluição.”
Mas afinal, o estresse é apenas um problema individual ou o reflexo da forma como a cidade funciona? Para a psicanalista, o comportamento no trânsito e na rotina urbana é resultado de um modelo coletivo que estimula a pressa, a competição e pouca empatia. “A gente está sendo levado por esse mundo cada vez mais rápido a pensar que tem que se salvar sozinho, que tem que chegar primeiro. A educação no trânsito e a gentileza são temas centrais.”
A pesquisa também revela que o estresse pesa mais justamente sobre quem está na fase mais ativa da vida profissional. Trabalho, filhos, contas, deslocamentos longos e cobranças constantes acabam se acumulando. “São adultos jovens com várias responsabilidades ao mesmo tempo: filhos pequenos, sustentar a família, deslocamento para o trabalho. O mundo do trabalho hoje cobra hiperprodutividade e vive sob instabilidade.”
A especialista também destaca que mudanças são possíveis e cita exemplos simples que ajudam a reduzir tensões no cotidiano, como o respeito ao pedestre. “Na Unicamp, a faixa de pedestres é sagrada. Se é possível construir essa cultura dentro da universidade, a cidade também é capaz de construir.”
Outro dado preocupante do levantamento é que muitas pessoas relatam já acordar cansadas e estressadas, antes mesmo de enfrentar o dia. Isso acende um alerta para questões como sono de má qualidade, excesso de telas e até o barulho urbano. “As pessoas têm dormido mal por causa das telas, mas também pelo barulho da cidade. O silêncio é fundamental para a gente se recuperar. Sem isso, vira uma bola de neve de estresse.”
Ansiedade, crises de pânico e tristeza frequente acabam sendo normalizadas, mas a professora reforça que esses sinais não devem ser ignorados. Campinas tem uma rede de saúde ampla, e procurar ajuda é um passo importante. “Quando os sintomas incomodam muito, a pessoa pode procurar uma unidade de saúde. Mas também é importante pensar em mudanças no estilo de vida, fazer pausas, cuidar do sono, desligar um pouco.”
Por fim, Rosana faz um alerta sobre a cultura que romantiza o cansaço e associa exaustão à eficiência. Segundo ela, quando a mente não para, o corpo acaba parando à força. “Quando o nosso psiquismo não é capaz de parar, o corpo para. A gente vive num modelo que valoriza só a produtividade, mas a gente precisa perguntar: produzir o quê, de que forma e com que consequências?”.
A professora e psicanalista reforça que enfrentar o estresse urbano passa tanto por mudanças individuais quanto por ações coletivas e políticas públicas. Repensar o ritmo da cidade, melhorar o transporte, reduzir o barulho e valorizar o cuidado com a saúde são passos fundamentais para tornar Campinas e outras grandes cidades menos estressantes.




