O dia 9 de agosto de 2024 foi marcado por uma notícia que abalou a todos. As imagens, que eram compartilhadas nas redes sociais, davam a impressão de se tratar de um avião de pequeno porte, mas o som já dava a dimensão de que era algo muito maior. Até chegar a confirmação de que a aeronave que sofreu o acidente tinha 62 pessoas a bordo.
Muita dúvida, fumaça e uma grande comoção. Afinal, o avião da Voepass caiu em um bairro de casas, o residencial Recanto Florido, em Vinhedo, nunca tinha vivido uma situação como essa, como relatou a conselheira da associação de moradores, Sílvia Bongiovanni.
“Nós tínhamos uma vida do interior, numa cidade maravilhosa, em um condomínio esplêndido. E de repente, nós somos arrematados arrebatados com 62 corpos nos nossos quintais, porque o nosso condomínio não é grande. Então agora eu peço que vocês entendam a nossa situação do portão para dentro é, os nossos moradores precisam desse tempo também, porque não foi só um barulho, só um avião. Nós tivemos toda uma emoção aqui”, afirmou a conselheira.
O avião caiu no quintal de uma casa, atingindo uma parte da estrutura da residência. Dentro estava o analista de sistemas Luís Augusto de Oliveira, de 62 anos. Ele teve um sangue frio de não sair para ver o que estava acontecendo. Se tivesse feito isso, seria mais uma vítima da tragédia. Dias após o acidente ele chegou a conversar com os jornalistas do lado de fora do condomínio, depois se recolheu e ainda não se sente confortável em gravar entrevistas. Ele gravou um vídeo em que agradeceu as mensagens de apoio.
As equipes de resgate chegaram em menos de 10 minutos após o acidente. Mesmo em um cenário tão delicado, o trabalho de remoção dos corpos das vítimas começou na mesma noite. Equipes de ao menos 10 cidades da região, além de São Paulo, ajudaram nesse trabalho.
Após 29 horas, os corpos das 62 vítimas e um cachorro que também era transportado na aeronave foram recolhidos e encaminhados ao Instituto Médico Legal de São Paulo, onde havia mais estrutura para fazer os reconhecimentos e dar suporte às famílias. Aeronave partiu de Cascavel, no Paraná, levando 58 passageiros e seguia para Guarulhos, na grande São Paulo.
Foi o primeiro acidente aéreo desde 2007, quando um avião da Tam não conseguiu parar no aeroporto de Congonhas, na capital, e matou 199 pessoas. A tragédia em Vinhedo foi o quinto maior em número de mortes da história da aviação brasileira.
O dia 9 de agosto de 2024 não vai sair da memória dos moradores do distrito da Capela, em Vinhedo tão cedo, na verdade, provavelmente nunca.
Em todos os dias de cobertura, o que a reportagem viu foi pessoas passando na frente, olhando, tentando encontrar algum vestígio da queda da aeronave. Naquele momento, não era possível ver nada da portaria, mas as flores continuavam sendo depositadas.
O Alfredo Júnior é consultor de vendas e mora no residencial há 20 anos. Ele estava trabalhando em casa quando ouviu o momento da queda do avião.
“Eu estava trabalhando em casa. Eu estava com o laptop aberto que eu cheguei 13h10 e eu cheguei, sentei e abri o laptop para continuar trabalhando e foi nesse momento que eu lembro de ter aberto o laptop, escutado o barulho”, disse.
Ele diz que o sentimento é de impotência por não ter controle para evitar a tragédia. O que chamou a atenção do morador é a união entre os vizinhos. Atitude que ele nunca presenciou em todos esses anos.
“Fiquei comovido com a união dos moradores, porque a gente se prontificou a dar café, chocolate, tudo para as pessoas. Minha esposa que estava do lado de fora, a minha esposa é uma pessoa muito ativa. Ela já passou no mercado, já falou com o homem do mercado. Ele deu coca, refrigerante e deu lanche, o outro mercado, fardos de água. Um menino que tem uma empresa pequena, ele mesmo fez salgado para os bombeiros. A gente vive aqui há 20 anos, eu tenho morador que está 20 anos aqui que a pessoa as vezes nem bom dia falava para mim”, acrescentou o consultor de vendas.
Alfredo fez questão de dizer a reportagem da CBN que queria que uma mensagem chegasse a família do piloto e copiloto. Ele tem certeza que a ação deles foi fundamental para que a aeronave não caísse no bairro.
A Elaine Martins da Silva é professora de uma escola que fica na região próxima ao condomínio. Ela conta que viu o avião passando por cima da escola, que também acredita que o piloto conseguiu desviar da parte mais populosa do bairro.
“É um sentimento que eu nunca imaginei sentir. Eu não sei nominar, ontem eu conversei com a psicóloga, é isso. Eu não sei nomear o que eu estou sentindo. Além de muito medo, as crianças estão bem assustadas também”, disse.
O susto ainda é um momento delicado para ela e apesar de participar e ajudar as equipes e vizinhos do local, ela demorou para entender o que realmente aconteceu.
“Então acho que foi um capítulo que ninguém previa e de muito drama, muito terror também”, finalizou Elaine.
O Cenipa divulgou apenas um relatório parcial sobre o que pode ter provocado o acidente. A hipótese mais provável é que o voo tenha sido prejudicado pela formação de gelo a 17 mil pés. O órgão de fiscalização confirmou que houve um relato do piloto sobre uma possível falha no sistema que derrete o gelo acumulado na aeronave tenha falhado e que o co-piloto teria relatado muito gelo no trajeto.
O relatório preliminar confirma que um dos packs do motor, peça que controla a pressurização e climatização do avião, não estava funcionando, mas isso estava previsto no plano de voo e não impedia a aeronave de operar.
Os dados recuperados da comunicação ainda apontam que a torre de comando em Guarulhos autorizou o piloto a iniciar uma manobra para procedimento de descida, mas mantendo a altitude, já que outro avião, que voava em altitude mais baixa, pousaria antes.
O relatório completo pode demorar anos para ficar pronto.
Em Brasília, uma comissão da Câmara dos Deputados também apura o que pode mudar na legislação de segurança aeroviária. O presidente da Voepass foi ouvido. José Felício Filho confirmou que a empresa reduziu as operações após o acidente. Muitas rotas foram suspensas, e o acordo com outras companhias aéreas em trechos menos movimentados também foram rompidos.
Algo que não vai mudar é que o Residencial Recanto Florido está marcado na história da aviação brasileira. O morador da casa atingida pela aeronave se mudou, enquanto a empresa ainda finaliza o trabalho de desinfecção e limpeza da área.